#17 compartilhado
“…em dois meses eu perdi aproximadamente 20 kg de uma forma saudável.
O problema era que eu não via diferença nenhuma no meu corpo com 20kg a menos, as pessoas diziam que eu tinha emagrecido, mas eu não enxergava isso no espelho, não me sentia mais magra.”
Por Francine Derschner
Como foi interessante ler os relatos das outras mulheres nesse espaço, me identifiquei com muita coisa mesmo e fiquei incentivada a contar a minha história também. Eu sempre fui gorda desde que consigo me lembrar e desde muito nova descobri que ser gorda era um grande problema, devia ser já que desde os 8 anos minha mãe me colocava em regimes de diversos tipos e vários médicos confirmavam essa ideia de que ser gorda era terrível.
Minha história não é diferente nesse ponto de tantos outros relatos, as provocações na escola, inclusive de professoras bem intencionadas que sempre me incentivavam a perder peso, a pressão da família, a sensação de nunca ser aceita. Eu me pergunto se alguma mulher gorda cresceu sem ouvir aquelas frases padrão “Você tem que emagrecer agora enquanto é jovem, se não depois não arruma namorado” ou “Você tem um rosto lindo, ia ficar tão bonita se emagrecesse”, ou ainda “Não é pela estética, mas tem que pensar na sua saúde”… Obviamente tudo isso deixou traumas em mim, eu também me foquei em ser a “inteligente” na escola e na família, já que claramente ser bonita não era uma opção para mim.
Passei pela adolescência traumática padrão de muitas rejeições amorosas, muitas mesmo, insegurança, pouco apoio familiar e nenhuma auto-estima. O fato do corpo gordo ser um espaço público como a Jéssica já apontou nos textos aqui também não ajudou em nada. O que eu queria acrescentar ao debate é a minha relação com a perda de peso, como disse desde sempre fiz regime de todos os tipos : vigilantes do peso, medicamentos, florais, terapia, acupuntura e outros tantos, nenhum desses regimes surtiu efeito. E o que mais me machuca é que não fiz nenhuma dessas dietas por escolha, fui sempre levada pela minha mãe, isso se repetiu dos meus 9 anos até os 14 quando tive idade o bastante para me impor e me recusar a tudo aquilo, mas a pressão nunca verdadeiramente parou.
Eu odiava meu corpo e definitivamente queria emagrecer, mas odiava mais ainda os regimes traumáticos. Aliás foi nessa época de tantas restrições alimentares impostas que tive minha pior relação com a comida, minha mãe chegou a esconder doces em casa para que eu não comesse e claro que quando eu encontrava um desses esconderijos eu comia até o último pacote de bolacha, chegava a passar mal, era aquele desespero de não saber de novo quando ia comer um chocolate.
Quando cheguei nos meus 18 anos, resolvi entrar na academia e emagrecer por mim mesma (na verdade era pelos outros, tinha aceitado a ideia que só teria um relacionamento se perdesse peso, mas eu realmente acreditava que faria isso por mim). Virei vegetariana, parei de tomar refrigerante e controlei minha ingestão de açúcar, isso deu resultado em dois meses eu perdi aproximadamente 20 kg de uma forma saudável.
O problema era que eu não via diferença nenhuma no meu corpo com 20kg a menos, as pessoas diziam que eu tinha emagrecido, mas eu não enxergava isso no espelho, não me sentia mais magra. Para mim de certa forma só havia o corpo ideal ou nada e para esse corpo magro ainda faltava mais uns 20kg pelo menos.
O engraçado é que apesar da minha família perceber e elogiar a mudança também concordavam que ainda faltava um longo caminho, nenhum médico que eu visitei nesse período falou de como 20kg a menos melhoraria minha qualidade de vida, minha impressão era que estar acima o peso 5 ou 40kg dava no mesmo no quesito saúde e era igualmente inaceitável. O tempo passou e outras coisas foram acontecendo na minha vida, eu comecei a fazer dança do ventre, me descobri religiosamente na wicca, comecei um novo processo de terapia e quando eu vi eu tinha uma auto-estima e já não me importava mais em emagrecer.
Hoje eu recuperei todo o peso que perdi e um pouco mais, mas tenho uma vida muito feliz e plena, sou casada , trabalho e adoro a pessoa que eu sou, pela primeira vez sinto que pertenço ao meu corpo e tenho uma paz comigo mesma que não consegui encontrar enquanto estava mais magra, na verdade não consigo me imaginar de outra forma que não gorda. Minha cabeça mudou bastante e nesse momento ser gorda para mim é também uma escolha e um ato político de resistência. Não consigo conceber a ideia de emagrecer e aceitar o que a sociedade tenta impor sobre o meu corpo todos os dias, me dá nojo pensar em me tornar o padrão de mulher e o assédio indesejado que isso poderia trazer, pensar em emagrecer faz com que eu me sinta um pedaço de carne sendo preparado.
Sei que isso é meio extremo e entendo que em um caso de saúde grave eu posso ter que rever meus conceitos, mas me recuso enquanto ser humano a deixar que invadam novamente o espaço privado do meu corpo. Quero deixar claro que entendo totalmente as meninas que sofrem com o próprio corpo e querem emagrecer ou tem problemas de saúde, só sou contra a minha própria perda de peso.
Desejo que todas as mulheres que lerem esse texto possam tomar posse de seus próprios corpos e fazer com eles o que bem entenderem!