#20 compartilhado


“(…)um dia eu sei que eu eu vou me amar, vou enxergar minha beleza como algo inalienavelmente meu, não algo que eu conquistei e tenho que manter a qualquer custo, principalmente, estar mais próximo do padrão de beleza, não me trouxe felicidade nenhuma, a felicidade que eu sinto as vezes, não vem disso(…)”

Anônima

 

Olá, primeiramente gostaria de dizer que leio o seu blog desde a época do blogger, até já comentei uma vez, não comento muito coisa, pois o blog fala sobre feminismo, com foco em gordofobia e lesbiandade (pelo menos foi oq eu notei) e eu sou hétero e magra, logo prefiro ler e aprender a falar e acabar falando besteira.

Bom apesar de magra, sou mulher e também sofro pressão da mídia que prega um padrão de beleza irreal e inatingível até para as magras, não estou tentando comparar minhas experiências com as mulheres gordas que são as maiores vítimas desse padrão, minhas experiências são diferentes, mas são minhas e me fizeram sofrer.
Nunca fui gorda, quando criança era “fofinha” sabe criança magra, bochechudinha, com a barriguinha de criança, normal, fui crescendo e emagreci naturalmente e nunca tive “problemas com o peso” tinha 12 anos 37 kg, mas sempre adorei comer muito e apesar de não engordar muito, engordo, cheguei aos 13 com 42, depois 45, aos 14 tinha 50, magra, eu nem ligava para o meu peso, meu pai, que deixo claro é um homem, incrível, de esquerda, porém é um homem branco, hétero de classe média, que entende vários privilégios, mas que ainda é difícil entender oq se passa no universo feminino, dizia, olha está engordando, essa menina come demais, tenho medo dela ficar gorda, mas ao mesmo tempo me oferecia comida, me dizia que eu tinha que comer para ser saudável e me amar do jeito que eu sou, sabe aos 12, 13 anos isso te causa uma confusão mental.
Tudo começou de verdade quando me apaixonei por um menino lindo aos 12 anos, nessa época era uma menina saudável descobrindo a vida, as paixões, e essa paixonite me pegou de jeito. Esse menino, chamemos de Paulo, não era uma pessoa muito legal, quando eu tomei coragem para falar com ele, e dizer oq eu sentia, ele riu de mim, disse que eu era gorda, (gorda 12 anos e cerca de 45 kgs é gorda?!), que era feia e espinhuda, nossa fiquei tão arrasada, minhas amigas me consolaram, mas nada do que elas falaram deu certo, achei q ele estava certo eu errada, que se eu fosse magra, tivesse a pele bonita nada disso teria me acontecido, bem passei o resto do ano tentando emagrecer, e não foi difícil, parei de comer besteiras todo o dia no lanche, comecei a levar frutas e biscoitos saudáveis, passei a comer melhor, comia besteira as vezes, normal, mas logo emagreci, estava com 37kg, esbelta, todos me elogiaram muito, passei a me interessar por moda naquela época, adoro até hoje, então mais um motivo para emagrecer, chegava a dizer que o Paulo tinha me feito um favor, tava fazendo tratamento de acne, mudei o cabelo, passei a me vestir melhor, ano seguinte a menininha feia, estava linda, os meninos me elogiavam, estava nas nuvens, finalmente era tudo que eu sempre sonhei, mas o Paulo ainda me rejeitava, não entendia pq, eu era magra e bonita, não tinha motivos para ele não gostar de mim na minha cabeça, comecei a ficar depressiva e triste, minhas amigas me apoiaram, até gente que não me conhecia passou a me apoiar, fui me tornando vaidosa demais, só pensava em aparência, como se isso fosse me dar td, pegava fotos de artistas para me “inspirar” e dizia que um dia eu seria igual a elas, só que ninguém é daquele jeito, aquela é uma foto é de uma pessoa falsa, modificada, quer dizer nem aquele modelo é assim, fui parar em psicólogos, meus pais ficavam de coração rasgado de me ver tão jovem e tão amargurada. Ano seguinte mudei de escola e de vida, decidi relaxar comigo mesma, continuava uma menina vaidosa, só que desencanada sabe, voltei a ser feliz, a ter interesses, e isso durou até o segundo ano do ensino médio.
De verdade, não teve um estopim, eu era uma menina, inteligente, legal, no padrão de beleza, tirava fotos para um site de moda e fazia sucesso lá, tinha sonhos, namorados, era feminista, de esquerda, enfim, vida perfeita, o que cada vez mais me fazia sentir culpada por me sentir assim, em outubro de 2011, teve uma feira de ciências, uma das barracas era sobre saúde e nutrição, aonde tinha uma balança, subi para me pesar, e fiquei espantada, estava com 56kg, sim ainda era magra, tinha percebido que tinha engordado um pouco, mas n ligava até pq minha estrutura é esguia, não engordo na barriga, engordo mais em outros lugares, mas até ver aquele número não estava me importando, gostava do meu corpo, pensava em reduzir um pouco e emagrecer mais, só que n era determinante para mim, mas ali vendo aquele número, fiquei horrorizada, como me deixei engordar 9 kg em 1 ano, comecei o ano com 47 kg, eu pensava, estava comendo demais sem pensar nas consequências ?! Como você se enche de bolo, de salgado, após o almoço…
Comecei uma dieta, e aquilo foi o começo do fim. Comecei bem, reduzindo as besteiras diárias, o fast food semanal, uma coisa até boa para quem tem auto estima, oq nunca foi o meu caso, hoje eu percebo, em menos de 1 mês estava com 49 kg, antes vestia 38 as vezes 36, estava vestindo 36 as vezes 34, como eu queria, então fiquei obcecada outra vez, só que dessa vez pior, pois comecei a desenvolver um comportamento bizarro, eu literalmente ruminava, eu pegava o pacote de biscoito mastigava todo e depois cuspia, me sentia saudável fazendo isso, podia estar físico mas não psicologicamente, saia com meus amigos, comia, chegava em casa e laxante carregada de culpa, fazia dietas radicais para compensar, e eu mentia bem, ninguém reparava que eu estava sofrendo, meus amigos diziam que eu nunca tinha sido tão linda como naquela época, então fazia mais, e mais, estava obcecada com a minha aparência outra vez, queria ser linda e ponto, e na nossa sociedade, linda é branca, magra de cabelo liso, logo eu queria ser assim.
Meus pais descobriram meu transtorno alimentar, e como todo o bom pai, ele estragou tudo, as pessoas pensam que é prático curar um transtorno, dá uma surra e obriga a comer, eles começaram a me vigiar, me obrigavam a comer, eu só fazia a mesma coisa de outro jeito, quando eles descobriram de novo, eu estava anêmica, o médico chegou a pensar que era leucemia, estava com 41 kg, iniciei o tratamento da anemia e o psicológico que dura até hoje, estou fisicamente saudável, mas ainda tenho transtorno, minto na terapia, inclusive vou sair, estou bem na medida do possível, tenho 47,5kg, não me permito engordar, emagrecer, não vou negar, queria, mas não vou fazer, estou colocando minha saúde em primeiro lugar, estou vivendo, vou fazer faculdade agora, vivo conciliando meu transtorno alimentar com a minha vida, ele faz tão parte de mim que parece uma pessoa, as vezes amo meu transtorno, amo ruminar, me faz feliz, mas as vezes (a maioria das vezes) odeio, odeio ruminar, odeio ficar pensando em comida 24 horas por dia, odeio usar a escada ao invés do elevador, só para perder umas caloriazinhas, odeio negar aquele sorvete no calor, só pq é terça-feira e guloseimas só no fds.
Achei que estando no padrão de beleza tudo seria perfeito, mas não foi, achei que teria namorados, felicidade, achei que teria tudo. Ainda tiro fotos para o site de moda, sou famozinha lá, até me faz bem, apesar da moda ser ditatorial as vezes, a enxergo como uma forma de me expressar no mundo, e acho que todxs tem direito de estar na moda, do jeito que bem quiser, odeio quando alguns fashionistas dizem “gorda não pode (insira aqui qualquer roupa)” pq é mentira, gorda pode sim. Olha não consegui um namorado depois de estar bonita, só casinhos rápidos, não consigo me envolver com ninguém, tenho 18 anos e sou virgem, não que isso seja um problema, mas adoraria fazer sexo, ter um namorado, adoraria viver, penso q um namoro pode me engordar, tenho um medo extremo de engordar, tenho medo de não ter transtorno alimentar, tenho medo de me amar.
Apesar de tudo, não reproduzo gordofobia, quero que as meninas sejam felizes com seus corpos, tdx são lindxs, gordxs são lindxs, magrxs são lindos, brancxs, negrxs, asiáticxs, índixs, todos…um dia eu sei que eu eu vou me amar, vou enxergar minha beleza como algo inalienavelmente meu, não algo que eu conquistei e tenho que manter a qualquer custo, principalmente, estar mais próximo do padrão de beleza, não me trouxe felicidade nenhuma, a felicidade que eu sinto as vezes, não vem disso, vem da minha família, amigos, momentos legais, não vem do meu reflexo no espelho…por isso, se amem meninas, como dito lá em cima, não sou porta contra o padrão de beleza, mas eu posso dizer que isso não trás felicidade nenhuma.

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